sexta-feira, 30 de maio de 2014

Comentários sobre a realização da democracia e da filosofia


por Paulo Ayres

socialismo é a realização da democracia e o comunismo é a superação da democracia

democracia burguesa/liberal é uma democracia unilaterial e concentrada (problematicamente) na esfera política. Ora, a democracia tem que estar dentro da fábrica também! Dentro das empresas. Em várias esferas do nosso cotidiano.... Ou a democracia é apenas pela metade, como pregam os apologistas do capital? O propósito do socialismo é ampliar (extravasar) a democracia para as esferas econômicas e de outras relações sociais.

E quando se fala em sociedade comunista, o que isso significa?  Esta, por sua vez, representa uma etapa mais avançada ainda, pois o comunismo, como forma de organização social, é apenas um nome para sociedade emancipada - aquela sociedade que, caso a humanidade chegue lá algum dia, representaria a superação dialética da sociedade de classes (o mundo em que a gente vive). E, como a democracia é uma expressão do estado (que, por sua vez, é uma expressão da sociedade de classes), não faz muito sentido chamar a livre associação dos seres humanos de democracia.

Assim sendo, o socialismo, como estágio posterior ao mundo burguês, significa a realização da democracia (sua ampliação). E o comunismo, como estágio mais avançado ainda, significa a superação (Aufhebung) do Estado/democracia. (06/01/2014)

Trabalho manual e intelectual

Sérgio Lessa procura mostrar como a social-democracia do mundo capitalista e o socialismo (ou proto-socialismo, para ele) do modelo soviético do Leste Europeu (o stalinismo) convergiram, de alguma forma, nas suas tentativas insuficientes de implantar um "caráter socialista" sem transformar radicalmente as bases classistas do modo de produção. O motivo está na velha questão ontológica (sempre ressaltada neste blog) de diferenciar atividade fundante e outras formas de práxis (secundárias) como momentos distintos da reprodução social. Uma ideia que se mostra como um obstáculo para isso é a tese de um possível fim da diferença entre trabalho manual e trabalho intelectual. E é justamente ela que o teórico busca demonstrar como equivocada e criadora destes enormes problemas que tem consequências teóricas... e práticas também (afinal, a História está aí para nos mostrar o que deu errado nestes dois projetos do século XX: de um lado do muro, "humanizar o capitalismo" e, do outro, de superar o capital.

A sua leitura ortodoxa da teoria social de Marx continua firme e forte mesmo com as transformações ocorridas no capitalismo tardio 

Marxismo ortodoxo

A ortodoxia marxista é entendida aqui como a fidelidade ao método dialético de Marx para fazer uma leitura da realidade; um estatuto ontológico-metodológico que nos permite analisar a totalidade social e as transformações que nela ocorrem incessantemente - ou seja, não é um sistema de proposições estabelecidas e fechadas aos novos fenômenos, mas uma postura metodológica para estudar todos os novos fenômenos que acontecem e vão ainda acontecer (admitindo, portanto, incorporações críticas). Diferente de um marxismo heterodoxo e eclético (uma colcha de retalhos epistemológicos, comum no chamado "marxismo ocidental") e também difere da dogmática stalinista (o petrificado marxismo oficial da URSS pós-III Internacional, que faz parte do que ficou conhecido como "marxismo vulgar"). (18/05/2014)

Brevíssima nota sobre Marx como último clássico da Filosofia

Os Manuscritos de 1844, de Karl Marx, exercem um enorme fascínio. Não são poucos os leitores/estudantes da obra marxiana que se sentem inspirados por esses textos. Marx, ainda engatinhando na Economia Política e imbricando ela com sua formação filosófica (nessa época era um pós-hegeliano comunista e influenciado por Feuerbach), demonstra uma inquietação apaixonante na sua escrita (um estilo rousseauniano de encantar com as palavras ao criticar fortemente a forma da sociedade vigente). Mas os Manuscritos não são apenas uma insuficiência bela e transitória. Para além do anticapitalismo utópico apresentado, há algumas considerações consistentemente revolucionárias neste período: a distinção entre emancipação política e emancipação humana; e um tratamento da categoria trabalho (e do ser gerado pelo trabalho) tão radical que vai apontar o rumo da originalidade deste pensador. Marx, já em contato com vanguardas da classe operária, percebe o vínculo transformador e inevitável entre o legado da história da Filosofia ascendente e esta classe que funda o modo de produção capitalista: não têm como ir adiante no pensamento filosófico sem resolver esta questão estrutural. A realização da Filosofia passa pela emancipação desta classe (que, por sua posição de base da estrutura social, significa a emancipação de toda a humanidade). O interessante é que quanto mais Marx, posteriormente, avança na sua crítica da Economia Política (tendo como foco o estudo do capital e da sociedade burguesa), mais confirma que ele é o último clássico da Filosofia (daí temos uma certeza: a Filosofia burguesa já atingiu seu ápice com Hegel e nunca mais produzirá outro clássico; pelo contrário, seu caminho, desde então, é a decadência; entretanto, também há uma questão interessante: Marx vai ficar mesmo na posição de último clássico, por circunstâncias sócio-históricas, até a humanidade atingir o contexto revolucionário de construção de outro modo de produção [se atingir]?). (30/05/2014)
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