sexta-feira, 18 de julho de 2014

Poemas sobre a classe operária: O Operário em Desconstrução


O operário em desconstrução
Paulo Ayres

Se aquilo que tanto me angustia
É a ausência do meu porto de aflição
Segunda-feira ao sol, em pleno dia
Como posso sentir falta da exploração?
De fato, a forma é mesquinha e cruel
Mas o conteúdo humano está lá soterrado
Não é estranho que seja o inferno e o céu
O estranho é ver um anjo endiabrado
Que lhe dita absurdos ao ouvido
A anedota que este trabalho enobrece o homem
Nessa hora, eu sou apenas mais um absorvido
Os dois buracos negros me consomem
Onde está a aguardada escapatória?
A gente gravita em ambos os lados
Já não se sabe quem faz a nossa história
Apenas nos percebemos mutilados
Nesse contexto social, somos prisioneiros
Como um acessório de uma máquina de produção
Nunca nos sentiremos realmente inteiros
Mesmo lá fora, mendigando um ganha-pão
Se os empregos da produção estão diminuindo
Ou se a jornada está sofrendo intensificação
Quem não está dentro também está sentindo
A perca de sentido não deixa de ser uma sensação
Mas, quem diria, oh grande Demônio do desemprego
Que, na verdade, tu não passas de um espantalho?
A solução vital não está na labuta degenerada e nem no sossego
É entender que, a contragosto, tu indicas a centralidade do trabalho
= = =

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