sábado, 27 de maio de 2017

Poemas sobre a classe operária: Alta Madrugada


Alta madrugada
Paulo Ayres

A noite é uma criança
trabalhando numa fábrica europeia do século retrasado.
A noite é uma secreta dança
nua com o capeta, cujo som pelos grilos é abafado.

O bon vivant, o mal-do-século e a maioria silenciosa
todos disputam a titularidade do luar
Programa do Jô, hora-extra e rapid eye moviment
sonhos lúcidos e o pesadelo a se objetivar.

Já passa das duas e meia
as máquinas continuam a todo vapor
é alta madrugada com baixa imunidade
e a cidade nem sonha de onde vem o valor.

Quando acordamos em plena madrugada
um demônio estava nos observando na cama.
Na fábrica, o mito já é uma realidade lamentada
e o capataz tinhoso te vigia no cansativo drama.

É alta madrugada com baixa imunidade
e a cidade nem sonha de onde vem o valor.
= = =

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