sábado, 10 de junho de 2017

Poemas sobre a classe operária: Não Valho Um Real e Nem Cem


Não valho um real e nem cem
Paulo Ayres

Um dia descobri que não valho um real
Este dia foi libertador!
A dor da culpa e vergonha se dissipou pelos ares
E os olhares de condenação não me fizeram nem cócegas
A palavra vagabundo não me assusta
Descobri o valor que a vida custa
E o preços que nós pagamos.

Principalmente, gente como eu
Que cria todo dia, todo dia
Uma pesada mercadoria
Que sai das nossas mãos quentinhas
E, mesmo assim, é fria, bem fria.

Não valho um real e nem cem
Nem mil e nem um milhão de dólares
Não há dinheiro deste mundo que valha a minha vida
Eu faço esse um milhão de dólares
Mas esse um milhão de dólares não me faz
A palavra parasita me apareceu no vidro de uma Hilux branca.

Vendo-me gradualmente, de segunda à sexta
E trabalho gratuitamente, de segunda à sexta.

O deus do cifrão me compra, me domina, me assedia
Todo dia, todo santo dia
Mas não integralmente.
Minha mente pode alcançar voos altos
E posso dar um salto com o mão erguida e fechada
Quando esta maldita jornada termina.

Preço e valor são coisas distintas.
Valor mercantil e valor humanista também.
Por isso, nem mesmo na nota de cem
Eu vejo o meu retrato.
= = =

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